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terça-feira, 7 de outubro de 2008

CAMINHANTES DO PADRE IBIAPINA



Caminhantes do Padre Ibiapina



Giovani Luiz



INTRODUÇÃO

Fazer o Caminho de Santiago, na Espanha, é um sonho antigo. Considero,entretanto, ser muito dificil realizá-lo. O desafio é grande. Inicialmente por se tratar de um roteiro no exterior. Depois, por ser o percurso longo. A rota francesa, a mais divulgada, tem mais de 800 km. Isso exige uma disponibilidade de tempo que muitas pessoas não dispõem, cerca de, no mínimo, trinta dias. Por outro lado, o custo de fazer o Caminho é relativamente caro, pois o Euro é uma moeda forte.

Tenho outro sonho. Fazer o Caminho da Fé. Este é bem menos exigente. Situado aqui no Brasil. São cerca de 400 km que vai do interior de São Paulo, de uma cidadezinha chamada Tambaú até Aparecida, passando pelo sul de Minas Gerais.

Entretanto, mesmo sendo roteiro brasileiro, não é fácil. Exige também certa disponibilidade de tempo e de recursos financeiros, condições que precisam ocorrerem simultaneamente para viabilizar a concretização do sonho.

De repente tomei conhecimento que bem aqui, próximo de onde moro, foi inaugurado o roteiro denominado Nos Passos do Padre Ibiapina. No interior da Paraíba havia agora uma alternativa. O caminho do Padre Ibiapina estava aqui tão perto, tão disponível, tão acessível, porque não fazê-lo?

Este roteiro paraibano é ainda pouco conhecido. Até mesmo entre os conterrâneos, poucos são aqueles que o conhecem e ainda, muito menos aqueles que tiveram a oportunidade de fazê-lo. É verdade! Não tem o apelo do Roteiro da Fé, que fica em são Paulo. Muito menos o charme e o glamour do roteiro europeu Santiago de Compostela, na Espanha. Entretanto, o roteiro paraibano tem os seus atrativos e vale lembrar: o seu patrono fez história e teve uma vida voltada para o serviço aos mais necessitados, uma vida de santidade.

O roteiro paraibano tem proposta bem simples. O desafio é sair do Memorial de Frei Damião, situado em Guarabira, até o Santuário de Santa Fé, situado em Solânea.A distância entre estes dois pontos é de quase 60 km. O percurso deve ser feito a pé, a cavalo ou de bicicleta. O mais comum é fazê-lo a pé. Simplesmente andar. Andar... andar... andar.

Este tão importante, animal e significativo movimento do homem mais ancestral, mais primitivo, mais autêntico, o caminhar, é que desejava fazer e ... sentir. Sentir este movimento, sentir o caminho, Concentrar-se apenas no caminhar. Olhar o caminho. Voltar-se para o interior. Procurar aprofundar a dimensão espiritual do ser.Seriam três dias diferentes. Seriam três dias andando e deixando-se tomar pelo puro e simples caminhar.

Embora seja relativamente curto o percurso quando comparado com o Caminho da Fé e o de Santiago de Compostela, não deixa de ser um desafio para quem mora na cidade e não está acostumado a andar cerca de 20 quilometros a cada dia. É natural, portanto, que exista uma certa inquietação. Uma das mais insistentes perguntas que não queriam calar: Será que tenho saúde e disposição física para agüentar? Será que vale a pena, deixar o conforto da cidade, do ar condicionado, do automóvel e meter-me nas brenhas desconfortáveis e –quem sabe ?- até mesmo perigosas? Perder um final de semana e gastar dinheiro para andar, será que vale a pena?





MEMORIAL A FREI DAMIÃO

Aos pés da enorme estátua de frei Damião que se ergue, majestosa, em um dos altos montes que circunda a cidade de Guarabira, começa o roteiro. Eu estava contemplando a cidade lá embaixo, às minhas costas a escadaria que leva ao santuário que fica na base do monumento. O sol ainda estava ameno, às 7:30 horas, mas o dia prenunciava ser de muito calor.

- Vamos fazer um pouco de alongamento antes de começar a nossa caminhada! – convidou Isaac, o guia que nos acompanha nesta empreitada. Desde nossa saída de João Pessoa, cerca de 100 km de Guarabira, Isaac viera conosco na van da Mais Brasil Turismo empresa que estava organizando a viagem. Na cidade de Guarabira, outro guia também passou a nos acompanhar. A idéia, segundo revelou Isaac, era um dos guias ir à frente com aqueles que caminhavam mais rápido e outro ir ao final com aqueles mais vagarosos.

Enquanto estirava os músculos naquela sessão de ginástica, eu olhava os demais integrantes do nosso grupo. Durante a rápida viagem até ali, tivéramos, entretanto, oportunidade de nos auto-apresentar. Havia chamado a minha atenção uma senhora de origem francesa, já avançada em anos. Fiquei impressionado por ela se dispor a fazer a caminhada. As demais pessoas eram da faixa etária situada entre os 35 aos 55 anos.

A ginástica terminou, fizemos algumas orações de mãos dadas.

Clarinha, minha esposa, ao meu lado, ,e Quitéria, minha cunhada, ao lado dela, começamos a nossa caminhada. São quase 60 quilometros dali até o Santuário de Santa Fé, no município de Solânea-PB. O santuário fica às margens da rodovia que liga a cidade de Arara-PB, sede do município de mesmo nome, ao município de Solânea. O roteiro foi desenvolvido sob os auspícios da Diocese de Guarabira, com a participação do Sebrae, Governo do Estado da Paraíba e a Paraiwa, organização não-governamental, constituída em forma de OSCIP, fundada em 1994. Teve também a participação da Prefeitura Municipal de Guarabira e de outras edilidades da região.

Vi que todos estavam iniciando o percurso. São mais de 14 integrantes, todos procedentes de João Pessoa. Ao grupo original incorporou-se, quando da chegada em Guarabira, um rapaz de nome Leandro, na função de segundo guia e mais 3 peregrinos.

O Memorial a Frei Damião, segundo a informação que nos foi passada, é a terceira maior estátua do Brasil. Perde apenas para o Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, que é a maior de todas e para a estátua de padre Cícero, no Ceará. Fica localizado estrategicamente em um morro alto e de lá se avista a cidade de Guarabira e outras cidades próximas.

Virei o rosto para cima, admirando a estátua ( 32 metros de altura ) que se agiganta ao olhar do peregrino e, baixando os olhos para ver as cidades, lá embaixo, fui acometido de sentimentos paradoxais, motivado por aquele momento singular. Senti a minha diminuta dimensão espiritual, aos pés da grandiosa imagem que remetia à grandeza espiritual de Frei Damião.. Por outro lado, naquele instante, achava-me muito “ grande “, em relação aos demais seres humanos que viviam lá embaixo, naqueles aglomerados urbanos, que dali avistava, assim como em relação a todos os seres que fazem a humanidade comum, voltados para uma vida comezinha, preocupados com assuntos de um quotidiano banal, e, muitas vezes, vivendo em busca de miragens materiais, em um busca, muitas vezes, de objetivos mesquinhos e egoístas, distantes de encontrar sentido verdadeiro em suas existências. Eu me senti, naquele momento, muito diferente pelo simples, porém grandioso fato, de estar ali se propondo a fazer o caminho do Padre. Era também um sentimento de admiração para comigo mesmo: fora capaz de sair da rotina, do trivial, da tranqüila vida cheia de conforto urbano, para aprofundar um encontro comigo mesmo. Era como se rompesse com tudo, para, apenas a depender dos meus pés, enfrentar - esta é a palavra exata - para , em uma atitude de despojamento e de humildade, o cansaço e as agruras físicas que por cento adviriam a quem se dispõe a andar por tantos quilômetros. Porém, estava feliz Por estes três dias tudo passava a ser muito diferente do meu quotidiano que poderia ser considerado normal como o das demais pessoas: com tudo o que continha na verdade de artificial, longe do ser animal que também somos. Agora para me locomover não dependeria de um automóvel. Não usaria a força do motor. Não faria isso sentado, confortavelmente no ar condicionado. Tudo passa a ser muito simples e verdadeiramente natural. O mundo se resumiria no caminhar. Nada mais existiria.

A sensação interior de orgulho para comigo mesmo se bem que muito agradável,estava mesclada, entretanto, com uma leve preocupação. Não tinha nenhuma experiência em caminhar por cerca de 60 quilômetros, coisa nunca antes feita por mim.

Agora, naquela manhã de Sexta-feira, dia 17 de fevereiro de 2006, o percurso ainda desconhecido por nós, composto de trilhas e estradas de barro estava a nos esperar e... a desafiar. O dia estava espetacularmente bem iluminado pelo sol radiante como que colocado majestosamente no alto de um céu azul, lindo, sem nuvens. Embora ainda cedo, pois o relógio marcava 8:00 horas, o calor já era intenso, prenunciando um dia muito quente.

Mochila às costas, começamos a caminhada.


FOTOS
1- dA ESTATUA DE FREI DAMIÃO
2- Do grupo
3- do incio da caminhada
















CRUZEIRO DE ROMA

Construído no ano de 1899 em homenagem à Sagrada Família por um proprietário rural da região, situa-se a uma altitude de 507 metros, e este era o destino do nosso primeiro dia de caminhada. A distância a ser percorrida, do Memorial de frei Damião até o Cruzeiro de Roma, distrito de Bananeiras, é de 25,7 quilometros, o trecho mais longo de todos os dias. Essa distância, entretanto, é de certa forma compensada pela cobertura vegetal existente que permite ao peregrino desfrutar de um pouco de sombra, para aplacar o forte calor. Em situação de normalidade o pernoite é realizado ali mesmo, no Cruzeiro de Roma, em uma pousada rústica, construída ao lado da igreja, defronte de uma pequena praça que se abre logo após o pórtico de chegada, configurando-se em um arco gigante. Infelizmente por essa época o local estava passando por reforma e o pernoite não foi possível neste local tão significativo e tão cheio de religiosidade marcante dos traços de personalidade do nosso povo, que sempre escolhe lugares altos, como aquele para materializar os famosos cruzeiros, que se encontram em diversas cidades do interior do Nordeste, que se erguem como um clamor aos céus e como uma visão para todos que moram nas redondezas como que a lembrar sempre a dimensão sobrenatural que, do alto, passa a comandar a vida de todos. Como foi impossível ficarmos alí, tivemos que procurar outro pouso para descanso. Foi na Pousada do Brejo em Bananeiras que encontramos o apoio necessário nesta primeira noite e na seguinte. Bananeiras já foi uma grande produtora de café. Em 1852 o café produzido no município disputava em qualidade com o café produzido em São Paulo. Infelizmente, os cafezais foram dizimados com uma praga que surgiu em 1923 e que até hoje deixou sua marca deleteria. Bananeiras que se situa a 552 metros de altitude apresenta clima de montanha, sendo muito procurada nas meses de junho e julho, quando o frio é mais intenso, com temperatura em torno de 15º graus, à noite.

No segundo dia a distância a ser vencida é de 14,1 quilometros. É o menor trecho. Porém, apresenta pouca sombra. No terceiro e último dia, o percurso a ser percorrido é de 19,4 quilometros e termina no Santuário de Santa Fé, em Solânea, que é a chegada ao objetivo final.

No primeiro dia, por volta das 9:30 horas, cheguei, juntamente com os demais componentes do grupo, em Pirpirituba, município próximo a Guarabira, onde, junto à Igreja Matriz, na casa de apoio paroquial , fizemos a primeira parada para descanso. Ainda no primeiro dia, por volta das 11:30 horas, chegamos à Cachoeira do Roncador. Lá existe um restaurante rústico onde encomendamos o almoço, enquanto fomos nos refrescar tomando banho nas águas frias da cachoeira. O jantar ( do primeiro dia como do segundo dia ) foi em Bananeiras, na Pousada do Brejo.

No segundo dia começamos a caminhada no sopé do monte onde fica o Cruzeiro de Roma. É uma cansativa subida, muito íngreme.

Em função da longa caminhada do dia anterior eu estava sentindo as coxas e as pernas doloridas, em toda a sua extensão. A cada passo que dava sentia uma fisgada na altura da bacia. Olhando para os demais companheiros que se esforçavam como eu para subir aquele monte, pude notar que eles apresentavam, em seus semblantes, certo ar de cansaço físico, embora aparentando tranqüilidade e contentamento interior. Pensei : “ Nenhum deles apresentava o mesmo problema que eu estava sentindo” . Logo notei que o problema de alguns deles estava relacionado aos pés.. Tinham os pés cheios de bolhas, pelo esforço repetitivo de andar e pelo calo que os sapatos ao roçar na pele haviam provocado. Muitas vezes o vilão era o sapato novo, ainda não amaciado. Lembrei-me que no inicio daquela manhã, antes de sairmos, Isaac juntamente com Valmir, médico que integrava o nosso grupo, ajudaram a minorar o sofrimento delas. Com uma agulha esterilizada e uma linha, furavam a bolha e passavam esparadrapo especial para proteger o lugar dolorido.

Saímos da Pousada do Brejo e logo adiante uma fina chuva começou a molhar a todos os componentes do grupo. Alguns mais prevenidos tinham trazido roupa impermeável que rapidamente passaram a usar por cima da roupa normal. Outros, como não tinham como se proteger da chuva, mesmo assim, continuavam a seguir o caminho, normalmente, como que ignorando a chuva. Foi o meu caso, o de Clarinha e Quitéria. Ainda bem que a chuva não se acentuou, embora tenha nos acompanhado por quase toda a manhã.






GOIAMUNDUBA

Goiamunduba na língua indígena significa “ abundância de goiabas”. Era o nome de um antigo engenho de açúcar, que nos seus tempos áureos dominava esta região. De repente veio-me à mente os escritos de José Lins do Rego, sobretudo, Fogo Morto, magistral obra que retrata a derrocada de um ciclo econômico com a substituição do engenho pela usina. É como se estivesse ali presente, real, corporificado naquelas ruínas toda uma época que já passara. Hoje, entretanto, como que alquebrado pelos anos e pelo abandono, ruínas tristes, de uma Casa Grande que se mostra qual senhora envergonhada e encabulada, bastante deteriorada. Em frente a esta casa, do outro lado da estrada, tivemos a felicidade de ser recepcionados com um lanche especial servido no jardim e pomar que é refrigério nos dias de calor de uma casa simples, bem típica da região, erguida em taipa, moradia de um casal e de seus filhos atenciosos que nos acolheu afetuosamente. Estava presente também a secretaria de turismo de Bananeiras, Ana Gondim, com sua contagiante alegria. Estava também presente equipe de gravação de vídeo que filmou tudo. Depois dessa emocionante recepção, sob a orientação de um guia local, adentramos à mata de Goiamunduba que se avistava dali defronte de onde fizemos o lanche, São três florestas que formam uma Área de Relevante Interesse Ecológico -ARIE, formando 100 hectares de matas nativas. O grupo decidiu sair um pouco do roteiro para conhecer uma nascente d’água lá dentro, no mato. A sensação de entrar em uma mata fechada, como aquela, onde apenas uma estreita trilha permite que o caminhante possa conduzir os seus passos, é uma experiência interessante, sobretudo, pelos sons característicos da floresta, entremeados com momentos de profundo silêncio, próprios da mata. Mais adiante, antes de chegar na fonte, nos deparamos com uma clareira. As pessoas ficaram ali paradas, aguardando a vez de, em pequenos grupos de 4 pessoas, seguir adiante, para conhecer a nascente.Chamou-me a atenção o modo como que todos nós, com delicadeza, reverentes, nos aproximamos do local que foi considerado por todos nós, como que quase encantado e aquele momento revestia-se de toques de impressionismo mágico. O guia apanhou uma folha de uma planta que crescia próxima e improvisou um recipiente onde colheu um pouco daquela água cristalina e naturalmente fria. Cada um de nós tomou um pouco para refrescar e para brindar àquele momento especial. Ficamos admirando respeitosos, o brotar da água do nada, diretamente do chão, em um fino filete cristalino, por um certo período, depois voltamos para a clareira, para possibilitar a aproximação de outro grupo.

Uma das nossas colegas propôs que cada um de nós fizéssemos uma oração à mata, com um abraço às gigantescas árvores que ali, perto da clareira, se erguiam, majestosas. Então, cada um de nós, aceitando a proposta, escolheu um daqueles lindos exemplares da flora nativa e abraçou-as com emoção. Eu, naquele instante, tive a sensação de fazer parte daquele mundo da floresta, como integrante da natureza e um “ bicho da mata”, como aquele pássaro que cantava alegremente pousado em cima da copa de uma enorme jaqueira.

Mais tarde, ao sairmos da mata de Goiamunduba avistamos o casal Cícero Lucena- ex-prefeito de João Pessoa e Lauremília- sua esposa e vice-governadora do Estado que também faziam o caminho à pé. Soubemos depois que eles já fizeram esse caminho por várias vezes.

Lembro que ainda naquela manhã, antes de chegarmos em Goimunduba, passamos pelo engenho que fabrica a famosa aguardente “Rainha” ( e lembrei imediatamente do meu tio Carlos Pereira que é um apreciador responsável do produto). Tivemos assim oportunidade de visitar as instalações do engenho, se bem que o mesmo não estava moendo.

FOTOS DO ENGENHO


Quando saímos da mata de Goiamunduba as minhas coxas e pernas estavam muito doloridas. O caminhar para mim estava sendo muito difícil. Conversei com Isaac que me aconselhou fazer o restante do percurso na van, pois segundo me disse a situação poderia se complicar e no dia seguinte eu não ter a mínima condição de andar. Mesmo a contragosto resolvi obedecer. Em situação parecida com a minha estavam mais quatro integrantes do grupo que também foram orientados a fazer o restante do percurso daquele dia no veículo. Clarinha, solidária a mim, resolveu também me acompanhar no carro.

Depois do jantar naquela noite tivemos a oportunidade de conversar bastante e toquei um pouco de violão e cantei algumas músicas. Lembro que dois integrantes do grupo já estavam de passagem marcados para a Espanha. Fariam o Caminho de Santiago de Compostela. Para estes o caminho do Padre Ibiapina era uma espécie de treinamento para aquele percurso internacional, significativamente mais desafiador.

Disse também a eles na conversa daquela noite que tinha muita vontade de fazer Santiago de Compostela. Entretanto, pensei, não estava muito confiante em minhas pernas. Continuam a incomodar e naquela noite, apesar de Clarinha ter feito uma massagem com um produto especial recomendado por Isaac, senti dificuldade em dormir, pois as pernas doíam muito.

Ao amanhecer o dia, após tomar o café da manhã fizemos os exercícios de alongamentos, como já era de praxe. Minhas pernas pareciam não querer obedecer, cada passo era um tormento.

Estava começando a sentir uma sensação de frustração. Não seria capaz de terminar o caminho. Os demais companheiros poderiam fazer, eu não. Ficaria acompanhando, sentado na van. Era uma pena! Ao decidir fazer aquela caminhada eu estava com muita vontade de fazer todo o percurso rigorosamente a pé, para poder usufruir daqueles momentos singulares. Porém as pernas queriam dizer não.

Elevei o pensamento ao Padre Ibiapina. Pedi silenciosamente que ele, o patrono do caminho, intercedesse a Deus, me ajudasse a fazer o percurso daquele terceiro e último dia e que assim eu pudesse chegar em Santa Fé, caminhando e saudável.

Meu pedido foi atendido. Ao iniciar o percurso naquele dia passei a sentir firmeza em minhas pernas e o meu temor de não poder concluir o caminho se dissipou de forma surpreendente. Passei a caminhar com tanto ânimo que, sem querer, me postei à frente do grupo. Tamanha era minha disposição que Isaac e os demais companheiros ficaram admirados. A esposa de Valmir chegou até a comentar:

- Giovani parece que está turbinado!

Assim, foi com muita alegria que cheguei em Santa Fé.


FOTOS







PADRE IBIAPINA

Fizemos o roteiro em uma época muito oportuna, quando a igreja comemora os 123 anos da morte do padre Ibiapina, no dia 19 de fevereiro. Este religioso dedicou literalmente sua vida aos pobres do sertão nordestino, um povo extremamente carente e esquecido pelos governantes. Exemplo de doação e de incansável atuação para minorar a situação de profunda penúria do povo, padre Ibiapina construiu igrejas, cemitérios, casas de caridade, cisternas, apaziguou contendas entre famílias e passou a ser venerado como santo pelo povo simples do Nordeste, após a sua morte, como também o foi o Padre Cícero.

Nasceu no Ceará, na cidade de Sobral, no dia 05 de agosto de 1806. Foi batizado com o nome de José Antonio Pereira Ibiapina.( depois que se ordenou padre passou a chamar-se José Antonio de Maria Ibiapina, em homenagem à Virgem Maria).

Em 1823, aos 17 anos, José Antonio foi com a família para Fortaleza e ainda neste ano, para Pernambuco, estudar no Seminário de Olinda, com o intuíto de ser padre.

Um dos fatos marcantes de sua vida aconteceu em 1825. O seu pai foi fuzilado em praça pública, em Fortaleza-CE, em represália por haver participado da revolução denominada Confederação do Equador. Seu irmão mais velho, que também participara do movimento, foi preso e levado para a ilha de Fernando de Noronha, aonde veio a falecer. Ainda como castigo adicional os bens da família foram confiscados.

Com a morte do pai e do irmão, José Antonio teve que assumir a direção da família, voltando para o Ceará e, por conseguinte, tendo que interromper os estudos, pelo menos por certo tempo.

Conseguindo retornar para os seus estudos em Olinda, Ibiapina passa a freqüentar, além das aulas do seminário, aulas do curso de direito, recém instalado no Mosteiro de São Bento. Ocorreu, entretanto, que as aulas passaram a apresentar incompatibilidade de horário com os estudos do Seminário. Diante disso, José Antonio optou pelos estudos jurídicos. Em 1832 formou-se na primeira turma daquele curso, obtendo o grau de bacharel em direito.

Logo após a conclusão do curso, Ibiapina foi nomeado professor de Direito Natural.

Aproveitando as férias escolares, Ibiapina viaja para o Ceará para rever familiares e amigos. Conhece Carolina Clarence, por quem se apaixonou e com quem marca casamento para ser realizado nas próximas férias escolares, quando programa sua nova visita ao Ceará.

Volta para Olinda para o exercício do magistério quando recebe a notícia que fora eleito Deputado Geral, por sinal o mais votado do Ceará, para a Assembléia Legislativa Nacional, no Rio de Janeiro.

Encerrado o ano letivo, viaja para o Ceará para cuidar do casamento e tomar providências no que se refere à sua moradia no Rio de Janeiro para o exercício do mandato de deputado. Ao chegar no Ceará tem uma notícia desagradável: sua noiva havia fugido de casa e casado com o primo Antonio Sucupira, frustrando-se, dessa forma, o sonho de Ibiapina de constituir família.

Foi para o Rio de Janeiro e assumiu o mandato de deputado. Quando do encerramento dos trabalhos legislativos, em 1834, volta ao Ceará para assumir a função de juiz de direito e chefe de polícia. Funções que exerceu por pouco tempo.

Em março de 1835 volta ao Rio de Janeiro para reassumir sua vida pública, permanecendo como deputado até 1837. Decide não mais continuar na vida pública, sentindo-se impossibilitado de lutar e defender o homem sertanejo nordestino, pois o nordeste era desprezado e dominado por poderosos. Por ter tomado esta decisão não aceitou ser presidente da província de Pernambuco e teria rejeitado o convite para assumir o cargo de Ministro da Justiça.

Passou a residir em Recife a partir de 1838 e foi convidado para advogar na Paraíba, na Vila Real do Brejo de Areia.

Em 1840, Ibiapina instala escritório de advocacia no pátio do Carmo em Recife, onde trabalhou por dez anos. Revelou-se um dos profissionais mais notáveis de Pernambuco e ganhou o título de “ defensor dos pobres” pelo apoio e interesse em defender as causas dos mais humildes e desamparados.

Em 1850, Ibiapina decide fechar o escritório e renunciar a carreira de advogado passando a residir, recluso, no sítio Caxangá, rezando, estudando teologia e filosofia. O motivo dessa sua decisão teria sido a negação pela justiça de uma causa justa que o feriu muito, no íntimo.

O amigo Dr. Américo Magalhães preocupava-se com a situação de Ibiapina e incentivou o mesmo a tentar a vida clerical . Confessou ao amigo que era naquele momento a sua maior vontade. Mas que não se sujeitaria a nenhum exame ou condição.

Conseguiu realizar o seu desejo, graças as suas credenciais de seminarista e de sua vida ilibida. Recebeu a tonsura clerical em 11 de junho de 1853. No dia 12 de junho de 1853, recebeu as duas primeiras ordens menores de hostiário e leitor. Depois de receber ainda diversas outras ordens religiosas, aos 3 de julho de 1853, ordenou-se sacerdote, aos 47 anos de idade.

Depois de recusar diversos cargos honrosos na Igreja, dentre os quais não aceitou receber a mitra de bispo, deixou de lado a vida urbana, aos 50 anos de idade, e resolveu dedicar-se aos trabalhos missionários junto aos doentes, pobres e orfãs, pelo interior de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí, percorrendo a pé ou a cavalo mais de 601.758 km.

Conciliou várias intrigas, ensinou o povo a trabalhar em multirão, levantou e restaurou capelas, igrejas, cruzeiros, hospitais, cemitérios, açudes, cacimbas, barragens e estradas. Fundou 22 casas de caridade para órfãs, que eram entregues à administração das beatas.

Em 1876 , paralítico e se utilizando de cadeiras de rodas, fixou residência em Santa Fé, de onde supervisionava e orientava a administração das casas de caridade. Fez isso durante sete anos, mesmo doente, até sua morte.




FOTOS








SANTA FÉ

A chegada do nosso grupo de peregrinos à Santa Fé veio somar-se a uma grande multidão de romeiros que apinhavam o acesso ao santuário, o pátio e todas as dependência do complexo, que incluía uma capela, a casa onde morou o Padre, a casa paroquial, a casa de apoio, enorme, dentre outros ambientes.Todos reverenciam a memória de Ibiapina.

Fiquei deslumbrado com aquela verdadeira festa e com a enormidade do santuário, situado em uma região pobre e que se ergue inesperadamente, majestoso à beira da pista, que interliga Arara à Solânea.



FOTOS DO SANTUÁRIO




Apesar do cansaço físico do dia de caminhada não foi possível passar despercebido pela multidão. Nossa chegada foi triunfal. Fiz uma analogia com uma situação em que o maratonista, ou o piloto de fórmula 1, chega no ponto final de sua competição. Embora não estivéssemos, obviamente, participando de uma competição, porém a sensação de que havíamos vencido – a nos mesmos, o desânimo, a fraqueza, talvez – estava estampada em cada um de nossos rostos. A televisão filmou o grupo. Alguns, de nós, foram entrevistados. Logo depois fomos conduzidos diretamente para a casa paroquial onde fomos recebidos pelo bispo D. Muniz e outros religiosos que estavam presentes. Inclusive tive a alegria de encontrar o ex- colega do banco Paraiban, Nunes, jornalista e diácono. Almoçamos com eles em uma grande mesa, ouvindo o som de músicas religiosas de um carro de som estacionado em frente à casa que também orientava a todos os romeiros e chamava para uma missa campal que estava programada para pouco depois daquela hora do almoço.

Ao final da tarde pegamos a van e voltamos para João Pessoa. Durante o percurso comentei com os demais companheiros de viagem que o maior desafio ao se fazer os “ Passos do Padre Ibiapina”, como pude perceber naquele momento, ao final do trajeto, é enfrentar a topografia muito acidentada da região. Essa dificuldade é tanto maior nos dias muito quentes, quando o sol intenso e a excessiva luminosidade estão presentes. Todo o percurso, via Cruzeiro de Roma, praticamente, é feito subindo e descendo ladeiras. Quase não há trechos planos.

Fiquei pensando como foi oportuna a homenagem que se fez ao adorado padre nordestino, com a denominação e inauguração do caminho nos “ Passos do Padre Ibiapina” e com o santuário de Santa Fé, ambos em memória a uma personalidade marcante na história de nossa terra.

Ao aproximar-me de João Pessoa sentia-me realizado. Fora capaz de fazer os “Passos”. Agradeci ao patrono do caminho e a Deus por isso.


Camboinha-(Cabedelo-PB), maio de 2006

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

VIAGEM DE NAVIO

Viagem de Navio
Giovani Luiz



Dedicatória: à memória de Geraldo Fernando Pereira da Costa


O presente relato trata da viagem realizada no navio Armonia, no período de 03 a 11 de janeiro de 2006, com saída do porto de Salvador-BA, com destino ao porto de Santos-SP, com parada no Rio de Janeiro-RJ retornando para Salvador com atracação em Arraial do Cabo-RJ e Ilhéus-BA .

A DECISÃO - Ao pisar em cada um dos degraus da escada para subir à bordo, senti crescer dentro de mim forte emoção. Viajar de navio. Fazer um cruzeiro. Sempre considerei essa possibilidade tão remota e, algo praticamente impossível, que esse momento parecia irreal.
O fato, porém, é que estava embarcando, juntamente com a minha esposa Clarinha. e os amigos Marcondes e Terezinha, no Armonia, enorme navio de passageiros, com capacidade para cerca de 3.000 pessoas.
Algumas lembranças vieram-me à mente.
Eu, menino, visitei, várias vezes, o porto de Cabedelo, na cidade de mesmo nome, próximo a João Pessoa. Papai gostava de fazer passeios até lá e levava a família junto para ver os navios atracados. Naquela época não havia muro entre a rua por onde os carros transitavam e o cais, o que tornava a visitação bem fácil e sem burocracia, diferentemente dos dias atuais. Eu ficava olhando as embarcações atracadas, vendo os marinheiros, muitos deles estrangeiros, figuras exóticas, a se movimentarem lá em cima, dentro do navio, distantes.
Certa vez entrei em um navio da Marinha de Guerra que estava aberto à visitação pública. Havia uma fila enorme para subir no navio que, salvo engano, era o contratorpedeiro Pernambuco. Demorei muito para entrar, esperando, na fila, juntamente com os meus pais e irmãos.. Mas valeu a pena. Pude ver, pela primeira vez, um navio por dentro, inclusive a casa de máquinas. Ao voltar para casa, sentado ao lado de Cláudio Lúcio, um dos meus irmãos, no banco traseiro da baratinha Ford 29, conduzida, habilmente, por papai pela estrada de barro que ligava Cabedelo a João Pessoa, à época ainda não asfaltada e muito menos duplicada como hoje, fiquei imaginando como seria viajar em um daqueles navios.
Lembro-me que, à noite, quando fui dormir, ainda estava excitado com aquele acontecimento. Sonhei que era um passageiro , viajando escondido da tripulação. A situação era angustiante. Entretanto, paradoxalmente, achava-me feliz no sonho, pois, apesar de tudo isso, estava viajando no navio.
Olhando o passado vejo que no meu imaginário de menino o navio estava ligado á idéia de liberdade, ao sonho de conhecer o mundo e ao desejo – impossível de realizar, achava, no tempo da dura realidade do meu mundo de criança - de fazer uma viagem por alto mar.
Algumas outras lembranças vieram-me a mente, relacionadas à literatura náutica. Adolescente, li com interesse e com grande satisfação Robinson Crusoe, de Daniel Defoe. Outro livro muito bom que li chamava-se Moby Dick, de Hermman Melville. Não esqueço também de, Os Velhos Marinheiros, de Jorge Amado.
Outra lembrança relacionava-se a um acontecimento bem mais recente e à oportunidade de visitar o veleiro da Marinha, Cisne Branco. A visitação também foi em Cabedelo. Fiquei impressionado com a beleza da embarcação. Eu, orgulhoso Arrais Amador, tinha a habilitação concedida pela Capitania dos Portos da Paraíba para velejar no meu Dingue, pequeno barco à vela. Fiquei encantado com aquela embarcação. Leitor interessado da Enciclopédia do Mar e do Dicionário de Navegação à Vela, que havia comprado há pouco tempo atrás, fiquei identificando cada detalhe do veleiro, segundo a terminologia própria de navegação à vela.
A lembrança do meu Dingue. Os muitos passeios que fiz junto com Clarinha pelas praias de João Pessoa e de Cabedelo. Pelo porto de Cabedelo já havia passado muitas vezes em direção à praia de Jacaré, onde situava-se uma das instalações do Iate Clube da Paraíba, do qual era sócio, à bordo com minha mulher. Lembro-me, também, ela grávida de Luiz Augusto, mesmo assim, gostava de passear comigo, no barquinho.
Essas reminiscências são importantes para ajudar o leitor a compreender como foi emocionante ver-me subir as escadas do navio Armonia para fazer um cruzeiro.
O Armonia era muito diferente dos navios cargueiros que, na infância e adolescência, vira em Cabedelo. Não era também parecido com aqueles navios da Marinha que também visitara. Era um espetacular navio de passageiros, de 251 metros de comprimento, 13 andares, pesando cerca de 58.600 toneladas. Acho que a imponência da embarcação atracada ali no porto de Salvador, resplandecendo em plena Baia de Todos os Santos, contribuiu para aumentar a minha emoção.
Acredito que contribuiu para isso também a forma repentina como havíamos decidido – Clarinha e eu – fazer este passeio.
Fazer um cruzeiro não estava em nossos planos, pelo menos de curto ou médio prazo. Era considerado por nós como uma possibilidade distante no tempo.
Mas, eis que este cruzeiro de 8 dias, aconteceu, de forma inesperada. Marcondes e Terezinha, nossos amigos e companheiros do Lions Clube de João Pessoa IV Centenário, nos convidaram a fazer o cruzeiro com eles. Vieram ao nosso apartamento para mostrar o folheto sobre o navio, o roteiro, os valores para pagamento da viagem. Eles nos estimularam muito para fazermos a viagem juntos. Naquele momento agradeci o convite. Justifiquei a impossibilidade de fazer o passeio por dois motivos: O primeiro, estava trabalhando naquele período e, o segundo motivo, achava muito caro o cruzeiro.
Entretanto, ficamos, Clarinha e eu, com uma vontade enorme de fazer o passeio.
Depois, quando Marcondes e Terezinha saíram, ficamos conversando. Fizemos as contas. Apertando um pouco, era possível aceitar o convite. .Por outro lado, eu encontraria uma maneira de compensar a ausência de 8 dias no meu trabalho.
Logo cedo, na manhã seguinte, liguei para Marcondes para informar que havíamos decidido fazer o cruzeiro com eles. Marcondes e Terezinha ficaram muito contentes. De nossa parte também estávamos radiantes.
Assim, naquela mesma manhã, fui com Clarinha providenciar a compra das passagens. Conseguimos reservar cabine contígua à de Marcondes e Terezinha, situadas no “deckTormalina, na ponte 10. Cabine interna, um pouco mais baratas que as cabines externas, porém, com espaço igual e igualmente muito confortável.

Primeiro dia - Ao embarcar no Armonia, em Salvador,BA, tive a sensação de que entrava em um hotel de luxo. Chegar em Salvador exigiu a realização de uma quase maratona. Acordei muito cedo, por volta das 3:30 horas. Fiz, com Clarinha, de automóvel ( Luiz Rodrigo, à direção, acompanhado por Clara Giovana, dois de nossos filhos), o trecho de João Pessoa(PB) para Recife, onde, no Aeroporto Internacional dos Guararapes, apanhamos avião da Varig que nos levou ao Aeroporto Internacional Eduardo Magalhães, em Salvador. Chegamos por volta das 9:30 horas. Como só embarcaríamos no navio depois de 14:00 horas, fizemos um “ City Tour” para rever a cidade.
A primeira providência ao entrar no navio foi fazer a identificação e cadastrar o cartão de crédito na recepção, após o que recebemos, cada um de nós, um cartão de identificação que servia também de chave para adentrar à cabine e de cartão de crédito interno, específico, para fazer compras e cobrir eventuais despesas que não estavam incluídas no valor da passagem. Basicamente, para pagamento de bebidas e de eventuais compras de artigos das lojas do Shopping Centre Via della Spiga, centro comercial do navio.
O ambiente da recepção era muito acolhedor, assim como muito gentis as pessoas que nos atenderam, por sinal, de forma rápida e eficiente. Tanto é assim que demoramos pouco tempo nestes procedimentos. Eu notei que o embarque dos passageiros em Salvador foi muito bem organizado e sem tumulto, apesar da grande quantidade de pessoas que ali embarcaram.
Fomos conduzidos- nós quatro - até as nossas cabines. Fizemos um percurso relativamente longo até lá. Da ponte 6, onde situava-se a recepção e próximo à proa do navio até a ponte 10. Subimos de elevador, e, depois caminhamos um bom pedaço, até às nossas cabines que se situavam próximas à popa. No percurso, mesmo de forma rápida como o fizemos, deu para perceber a beleza dos ambientes, sentir o clima agradável do ar condicionado central, o perfeito funcionamento dos elevadores e, o mais importante, notar o semblante de satisfação e de alegria de todos os quais tivemos a oportunidade de encontrar pelo caminho. Muitos que encontramos eram passageiros embarcados no Rio de Janeiro e em Santos, conforme soube, posteriormente.
Logo após as malas chegarem às cabines, a camareira, de nome Putu, natural da Indonésia, trouxe uma cesta de frutas para nos saudar. Ela era muito simpática e não falava português. Porém, apesar do nosso inglês bastante rudimentar, nos comunicamos com ela, para nos apresentar e ouvir dela as boas vindas. Em seguida, Clarinha, eu, Marcondes e Terezinha, fomos andar pelo navio, em missão de reconhecimento. Este primeiro dia foi destinado à descoberta do navio.
Fomos ao restaurante Marco Polo, escolher o local à mesa para o jantar.No Armonia o jantar é um acontecimento importante. E, do inicio ao fim do cruzeiro, o lugar à mesa do restaurante, para o jantar, é o mesmo. Como é também o mesmo garçon que serve o jantar durante o passeio, todas as noites. No Armonia a mesa é para 10 pessoas que fazem a refeição noturna, juntos, durante todo o cruzeiro. Ficamos nós quatro em uma mesma mesa, a de número 158. Entretanto, não sabíamos, obviamente, quem seriam os demais ocupantes.
Mais tarde, por ocasião do horário do primeiro jantar à bordo, foi interessante sentar à mesa para aguardar os demais integrantes, desconhecidos, com quem compartilhamos o jantar.
Continuamos nossa caminhada pelo navio. . Fomos para o terraço de popa do nosso andar, olhar o espetáculo na Baia de Todos os Santos.
Rigorosamente às 17:00 horas o Armonia partiu O dia ainda estava claro e o céu muito azul, com poucas nuvens. As amarras foram soltas dos cabeços de amarração e o navio começou a se deslocar, de forma surpreendente. O movimento era no sentido de se distanciar do cais de forma lateral. Esperávamos que o mesmo fosse se deslocar puxado por rebocadores. Por sinal, havia um rebocador posicionado perto do navio, acreditamos que era apenas para dar apoio àquele gigantesco navio em caso de alguma necessidade, ou emergência. O próprio navio fazia, sozinho, sem o auxílio de rebocadores, a manobra de saída do cais. As hélices agitavam a água que provocava grande borbulhar na lateral da embarcação que se deslocava na direção de bombordo ( que é o lado esquerdo do navio, visto de popa a proa, e que se contrapõe a estibordo ou boreste- que é o lado direito do navio) . Podíamos sentir uma leve trepidação com o deslocamento daquela enorme massa. Uma grande estrutura de 13 andares se deslocando lateralmente...
O final da tarde foi emocionante. Do nosso ponto de vista, ali postados no terraço, era como se a cidade de Salvador estivesse se distanciando, na marola branca e azulada do navio.
- Como é lindo este momento. Olhe aquele barco que se aproxima. Veja como a água do mar está calma.- comentei para Clarinha, que estava ao meu lado embevecida pela beleza do momento.
Ficamos ali, apreciando a navegação, até a noite - sem luar - chegar e inundar com a sua escuridão o horizonte.
De repente fomos como que despertados pelo som metálico do alto falante do sistema interno de som. Lembrou que o primeiro turno do jantar era às 19:30 horas e que todos os passageiros, daquele turno, deviam comparecer pontualmente no horário. Diante desse imperioso anúncio, fomos rápidos para a cabine nos trocar para a primeira refeição a bordo.
O restaurante Marco Pólo situava-se na ponte 5. Fomos recebidos pelo garçon Michelle. Um simpático italiano que falava português, com forte sotaque. Fomos os primeiros a chegar e ficamos aguardando os demais componentes da mesa. Chegou um casal de Aracaju, Roberto e Bernadete, outro casal de Recife, Salvador e Miriam, duas senhoras, também de Recife, irmãs, Marli e Zuzu. Ficamos conversando bastante animados. A amizade entre nós aconteceu de forma rápida e fácil Escolhemos no cardápio a entrada e o prato principal que Michelle foi providenciar.
Após nos servirmos destes dois pratos Michelle pediu que escolhêssemos a sobremesa. A comida estava deliciosa.
Em todas as noites o jantar foi, um grande acontecimento.. Ali, em torno daquela mesa, nos encontramos, todas as noites. Conversamos bastante e nos deliciamos com a saborosa cozinha do navio.
Naquela primeira noite o traje foi casual, nas cores italianas, branco, vermelho e verde. Em duas outras noites, o traje foi passeio formal.
Concluído o jantar, fomos, todo o grupo, 10 pessoas, para o Teatro La Fenice, na ponte 6. Após assistir o espetáculo denominado “ Máscaras” apresentado pelo diretor de cruzeiro Fábio,que foi um lindo show de folclore, música e alegria italiana, fomos caminhar pelo navio. Passamos pelo Bar del Duomo, na ponte 5, onde estava se apresentando a “ Via Brasil Band”. Em seguida, fomos ao “ Moulin Rouge Piano Bar, na ponte 6, onde tocava e cantava Charlie, músicas românticas e lentas. Depois, vencidos pelo cansaço , não esperamos pela guloseima “ Pequenos Doces “ que foram servidos a 0:30 hs . Nos dirigimos às nossas cabines para descansar.
Naquela noite, conversando sobre os acontecimentos do dia, antes de dormir, contei para Clarinha que havia sentido grande emoção por ocasião do embarque. Ela disse-me que também havia sentido uma forte emoção naquele momento em que embarcou.


Segundo dia – Acordei logo cedo, por volta das 6:30 horas. Liguei a televisão no canal 1 e pude observar a proa do navio e o seu movimento cortando o mar, que estava muito calmo. Este canal do circuito interno de TV, durante as vinte e quatro horas, mostrava a proa do navio como se fosse visto da ponte de comando.
Como estava dizendo, o mar estava calmo e o dia lindo. Após tomar banho e enquanto esperava Clarinha fazer a sua toalete, fui para a ponte de popa – que era bem próxima da cabine em que ficamos. Fiquei apreciando a navegação, a marola que o navio ia deixando para trás. Prestei bem atenção no suave barulho da água que parece ao de uma grande cachoeira. Olhei para todos os lados e vi apenas mar e céu. Nem sinal de terra. Estávamos em alto mar. Só na quinta feira – ou seja, 40 horas depois de sairmos de Salvador é que atracaríamos no porto do Rio de Janeiro. De fato, saímos da Baia de Todos os Santos, na terça –feira, 03 de janeiro, ás 17 horas, e chegamos no Rio de Janeiro na quinta-feira, dia 05 de janeiro, às 9:00 horas. Naquele momento era só mar e céu e a sensação boa de estar em alto mar. Pela primeira vez na vida eu sentia isso. Estava gostando da experiência.
Logo em seguida, chegou Marcondes e ficamos apreciando a navegação enquanto esperávamos nossas mulheres. Marcondes estava de posse de sua câmara e passou a filmar de vários ângulos o navio, a navegação e aquela linda manhã.
- Giovani não vejo nenhum peixe saltando é uma pena, quero filma-los- comentou.
Disse para ele que também não tinha visto nenhum peixe, apesar de estar ali há algum tempo. Só dava para ver a amplidão do mar.
Terezinha e Clarinha chegaram juntas. Elas também ficaram apreciando a navegação conosco por um bom tempo e expressaram satisfação em estar ali naquela manhã maravilhosa.
Comentei que estava impressionado com a estabilidade do navio. Aqui vai uma observação o navio dava a impressão de estar parado, tal a sua estabilidade. Se estivéssemos em algum ambiente interno, em que não se tivesse visão para o mar, a sensação era como se a embarcação estivesse parada.
Naquele momento, entretanto, e dali onde estávamos, dava para perceber, nitidamente, o deslocamento do navio. A velocidade provável era cerca de 20 nós, o que corresponde a pouco menos de 40 km /por hora. Naquele dia, por volta das 9:00 horas passamos à nossa direita pelo pequeno Arquipélago de Abrolhos, a uma distância de 7 milhas náuticas.Por volta das 17:00 horas o navio costeou a cidade de Vitória, capital do Estado do Espírito Santo, a uma distancia de 25 milhas náuticas.
Subimos na escada de popa e no andar seguinte entramos no Restaurante La Brasserie onde fomos fazer a refeição matinal. Comemos bem devagar, apreciando o mar, através do grande painel de vidro do restaurante, que era climatizado e, que, por sinal, estava com temperatura muito agradável.
Naquele dia decidimos continuar o reconhecimento do navio, pois no dia anterior ficou muita coisa ainda para se ver. Fomos andar por todos os “ decks ” . Marcondes tinha especial interesse em rever o cassino. Saímos juntos, passamos pelas piscinas – que se situavam no mesmo nível do restaurante em que tínhamos feito a refeição matinal, o La Brasserie. Na área de apoio das piscinas não tinha nenhuma cadeira- espreguiçadeira disponível. As banheiras coletivas de hidro-massagem também estavam com capacidade máxima.Como não havia mais lugar para ficarmos, continuamos nosso caminho.
O Palm Beach Casino, situado no deck 6 , diferentemente das piscinas, estava quase deserto. Apenas uma passageira utilizava uma das máquinas caça-níquel. Todas as demais máquinas estavam ligadas e com suas luzes chamativas acesas e, algumas delas, com as luzes piscando. Marcondes passou a pilotar uma delas, após adquirir um lote de fichas no caixa. As máquinas que estavam sendo usadas emitiam música repetitiva característica. O leve balançar do ambiente fazia a gente se lembrar que estava embarcado. Lembro que naquela noite voltamos ao cassino. Ficamos, então, impressionados com a quantidade de gente que estava jogando. A movimentação de pessoas era grande.
Continuando nossa caminhada naquela manhã fomos para a ponte 7 conhecer o “ Armonia Lounge”, onde ficamos um bom pedaço, sentados em confortáveis poltronas, conversando.
- Marcondes- eu falei - estou bastante agradecido pelo convite que você e Terezinha nos fizeram para fazer este cruzeiro. Para mim se constitui em uma grande realização. Imaginava poder fazer passeio como este depois dos sessenta anos. Fazê-lo aos cinqüenta e cinco, foi além da minha expectativa. Isso aconteceu graças, em parte, ao convite seu e de Terezinha.
- Para mim também esta sendo um excelente passeio – disse Clarinha.
Em seguida nos dirigimos para o Restaurante Self Service La Brasserie, para o almoço. Depois do almoço decidimos descansar um pouco em nossas cabines.
À tarde, depois de dar uma olhada na navegação e no mar, da área externa do andar onde se situavam as nossas cabines, fomos para a ponte 11, onde, no bar IL Girasole, o Trio Ottawa tocava lindas melodias italianas.Um rapaz e duas moças cantavam . O rapaz acompanhava ao teclado. O ambiente era bastante descontraído e ficava na área externa, próxima às piscinas. Fazia um pouco de calor ali. Decidimos continuar o passeio e nos dirigimos à ponte 6 , para o Bar del Duomo. Lá estava acontecendo um bingo. Compramos a cartela e participamos alegremente do jogo. Infelizmente não ganhamos. Porém, valeu a diversão. Depois, incentivado por Marcondes e Clarinha, fui fazer a minha inscrição no Espetáculo de Talentos que fazia ensaio naquele momento e cuja apresentação estava prevista para acontecer logo em seguida, às 18:00 horas. Quando chegamos ao Bar del Duomo, local do evento, já tinha muitos outros passageiros ensaiando suas apresentações musicais.Marcondes sugeriu que eu cantasse É Preciso Saber Viver, de Roberto Carlos. Porém, não foi possível cantar esta música, pois outra pessoa a tinha escolhido.Cantei o samba Mal Acostumado, de Araketu, acompanhado pela Via Brasil Band. Por ocasião da apresentação foi realizada uma verdadeira festa, com a presença no palco do grupo de animação de bordo. Recebi uma medalha da MSC cruzeiros e um certificado de participação. Foi muito interessante.
Era imperioso observar a hora do jantar com rigor sob pena de ficarmos com fome. Assim, fomos rápidos nos preparar em nossas cabines. Tínhamos que chegar pontualmente às 19:30 horas. Naquele momento ainda estava claro, porém, o relógio marcava que já passava das 18:00 horas. É que o horário de bordo seguia agora o horário de verão brasileiro e os relógios foram adiantados em 1 hora, na noite anterior, na saída de Salvador.
O traje sugerido para aquela noite era gala. Foi oferecido um coquetel de boas vindas para os passageiros embarcados em Salvador, para nós, portanto. Coloquei o paletó e a gravata, Clarinha se aprontou toda com um vestido longo, muito bonito e lá fomos nós para o Restaurante Marco Pólo. No caminho nos encontramos no elevador com Salvador e Miriam. Salvador estava vestindo uma camisa de manga longa e quando nos viu vestidos formalmente, lembrou-se, então, que o traje da noite era gala e resolveu voltar à cabine para se trocar.
Lá estávamos todos nós, sentados à mesa, esperando que Michelle servisse o jantar. Como da primeira noite, de repente, as luzes apagaram-se só que, diferentemente da primeira noite, a escuridão demorou muito. Avaliei mental e silenciosamente a situação. Poderia ter ocorrido pane nos geradores. O defeito que se prenunciara na noite anterior, imaginei, se intensificou. A situação seria muito desagradável. O ar condicionado deixaria de funcionar. Os elevadores também. A escuridão total não permitia se enxergar nada. Não sabia se haveria luz de emergência que pudesse indicar pelo menos as saídas pelas escadas. Mas saída para onde? A situação poderia ser bem problemática. Tudo isso passou rapidamente pela minha mente. De repente, porém, adentra o salão do restaurante um batalhão de garçons, cada um deles portando uma linda torta, sobre elas um fogo especial, para iluminar o ambiente. Foi uma grata surpresa. Todos nós ficamos bastante aliviados ao saber que o corte da luz tinha sido proposital para permitir maior efeito. Tratava-se de uma saudação especial feita pelos garçons aos hóspedes embarcados em Salvador. Quando terminou aquele gastronômico desfile, Michelle nos trouxe um bom pedaço de torta gelada depois de apagar o foguinho que teimava em arder em cima dela, apesar de seus esforços para apagar.
Quando chegamos no Armonia Lounge havia uma pequena multidão esperando a abertura do salão onde ocorreu o coquetel de boas vindas. Entramos na fila. Pouco demorou. Foram abertas as portas e cada casal - ou solteiro- adentrou o recinto e era cumprimentado pelo Comandante Giusepe Galano, para a foto oficial do cruzeiro. Esta foto em tamanho 25 cm por 20 cm, foi vendida por US$ 16,50. Depois que fizemos a foto fomos sentar em torno de uma mesa e apreciar a movimentação dos passageiros que, em fila, cumprimentavam e eram cumprimentados pelo comandante. No palco a música era executada pela Silio´s Band, outra banda de bordo, especialista em canções italianas.
Após cumprimentar a todos, o comandante se dirigiu ao salão para convidar uma das passageiras para dançar. Logo em seguida os casais puderam dançar também. Lá fomos nós, satisfeitos, Clarinha e eu, dançar naquele acolhedor recinto. Os garçons ofereciam bebidas e tira-gostos variados. Foi realmente um lindo e emocionante momento.
Em seguida nos dirigimos para o Teatro La Fenice para assistirmos o show daquela noite intitulado “ Galleggiando”. Como todos os shows apresentados em cada noite do cruzeiro, este também foi de muito bom nível - e bastante divertido.
Para terminar a noite, depois do Teatro, fomos para o Moulin Rouge Piano Bar esperar pelos docinhos que seriam servidos à 00:30 horas.
Terceiro dia – A chuva saudou a nossa chegada ao Rio de Janeiro, segundo revelava a TV, no canal 1..Vi os pingos na janela da ponte de comando, mostrado pela câmara. O limpador da janela, muito parecido com o dos limpadores de para-brisa de automóveis, funcionava em seu vai-e-vem incessante. A TV- no canal 1 - mostrava terra à vista. Não era possível ainda identificar nenhuma construção, casa ou prédio. Porém, via-se a formação de montes ao longe, no horizonte.
- Clarinha acorde! Chegamos ao Rio de Janeiro. Está chovendo. - anunciei para despertar minha mulher.
Depressa nos preparamos e fomos para a nossa área externa apreciar a chegada à Cidade Maravilhosa.
Em outras oportunidades tinha chegado ao Rio de Janeiro pelo ar- de avião e por terra, tanto de ônibus, quanto de carro. Agora via a cidade por um outro ângulo, a chegada por mar, de navio.
Ainda não dava para ver a ponte Rio-Niteroi que apareceu logo em seguida. Mas dava para ver grandes pedras rochosas ao lado do navio, que se deslocava lentamente, á busca do cais. A chuva era bem pouquinha, um chuviscar insistente. Logo vimos a Ilha Fiscal e a Escola Naval. A ponte Rio-Niterói apareceu, então, imponente.
O navio se aproximava do cais. O rebocador se posicionou, perto. Vi muitas embarcações no porto, atracadas. Vários aviões pousavam e levantavam vôo no Aeroporto Santos Dumont, cuja pista ficava bem perto do mar. Os prédios já se anunciavam. Um pouco depois deu para se ver os veículos se movimentando, pela ponte. O navio começou os procedimentos de atracação. Chamou atenção o movimento lateral que começou a fazer, se aproximando do cais. Em seguida, vi que as grossas cordas estavam sendo lançadas do navio, da ponte situada ao nível do cais, para serem amarradas nos cabeços de amarração do porto. A movimentação do porto era grande.
Por volta das 10 horas houve a liberação para os passageiros puderem visitar a cidade.
Salvador e Miriam, eu e Clarinha descemos, observando a placa indicativa “ gangway” ( prancha de desembarque) do 6º deck que nos levou à terra. Percebi que o terminal de passageiros do porto do Rio de Janeiro é bem mais cuidado do que o do porto de Salvador.
Lá fora havia um monte de motoristas de táxis e de vans, oferecendo seus serviços aos passageiros recém desembarcados. Contratamos o táxi de um senhor muito atencioso chamado Carlos e fomos dar uma volta pela cidade. Marcondes e Terezinha não foram conosco, preferiram ir até a agência dos correios, que se situava nas imediações.
Por volta de 15:30 horas regressamos ao navio. Confesso que já estava com muita vontade de voltar para o Armonia e ter a satisfação de almoçar no Restaurante La Brasserie. Fizemos isto, Clarinha, eu, Salvador e Miriam, apreciando a paisagem do Rio de Janeiro e, em seguida, fomos descansar um pouco em nossas cabines.
Rigorosamente, às 17:00 horas, vi pela câmara do canal 1, a proa do navio se deslocando. Estávamos deixando o Rio de Janeiro. Fomos para o terraço ver a saída do navio. Ficamos ali bastante tempo para ver a cidade como se estivesse se afastando de nós e diminuindo de tamanho. Subimos pelas escadas de popa, Clarinha e eu, e encontramos um local excelente para apreciar a saída do Rio de Janeiro. Foi lá, na discoteca, através de uma parede de vidro, em ambiente muito bem decorado, climatizado, sentados em confortáveis poltronas. Pelo sistema interno de som, a voz de alguém da ponte de comando ia explicando cada acidente geográfico que o navio ia mostrando em seu deslocamento. . Um pouco depois, já sentados à mesa do jantar,o horário de verão possibilitou que pudéssemos ver, através das escotilhas do restaurante Marco Pólo, o mar, e, perceber a velocidade de deslocamento do navio.
Depois do teatro, que esta noite apresentou o show “ Variety Variety” ,com destaque para a apresentação das sombras chinesas, e passar no Bar Del Duomo, fomos para a discoteca – lá na ponte 12,. Este ambiente funcionava até as 4:00 horas comandando por um “ D.J”, com música de CD.
Freqüentado principalmente por jovens que conversavam alegremente e dançavam, a discoteca era só animação. Ficamos lá um pouco e depois fomos para o Moulin Rouge Piano Bar, onde Charlie cantava e tocava ao piano, esperar que fosse servido os docinhos à 00:30 horas.
Quarto dia – Chegamos em Santos. O tempo estava bom, não estava chovendo. O porto de Santos chamou a atenção pelo seu movimento e seu tamanho. Lá estava atracado outro navio de passageiros chamado “ Island Escape” e o Armonia atracou no cais, do outro lado. Lá do terraço do nosso andar, vimos vários caminhões se aproximando para, acredito, abastecer o navio. Ao desembarcar pude perceber que o terminal de passageiros do porto de Santos é o mais moderno de todos os que visitamos em nosso cruzeiro. Em terra contratamos uma van que também era conduzida por Carlos – só que outra pessoa, é óbvio, coincidentemente, com o mesmo nome daquele do Rio de Janeiro. Fomos à Guarujá, depois voltamos para Santos. Fizemos passeio por várias praias e, por volta de 15: 30 horas, estávamos de volta ao navio para almoçar.
A saída de Santos – às 17:00 horas em ponto - foi triunfal. Com fogos e o cais apinhado de gente, saudando com lenço branco e com as mãos em forma de adeus, o Armonia que, como um gigante sensível, agradeceu com três apitos graves e saudosos. Foi emocionante. Clarinha disse que nunca tinha ficado tão emocionada em toda a viagem com aquela saudação especial feita pelo povo de Santos.
A biblioteca de bordo ficava ao lado do Armonia Lounge. Fui até lá, enquanto Clarinha se dirigiu à cabine para descansar um pouco. Descobri uma coleção de livros escritos em diversas línguas. O local era acolhedor. Havia poltronas confortáveis. Fiquei ali folheando um livro de Paulo Coelho, durante certo tempo e. depois me dirigi à cabine para me encontrar com Clarinha.
Depois do jantar fomos ao teatro e logo depois, Marcondes e Terezinha, decidiram dormir um pouco mais cedo e , assim, não esperaram o lanche das 0:30 horas.Clarinha e eu ficamos até mais tarde.
Quinto dia – Em Arraial do Cabo o navio ficou ao largo, pois não havia cais onde pudesse atracar. Um serviço de lanchas foi disponibilizado aos passageiros que desejassem ir á praia. Entramos na lancha, bastante confortável, que era dimensionada para transportar confortavelmente 150 pessoas. Depois, verifiquei que o navio possuía dez dessas lanchas em cada um dos lados o que perfazia o total de 20 unidades que estavam prontas para entrar em cena, caso ocorresse alguma emergência.
Quando chegamos à praia ficamos bem impressionados com a organização da equipe de apoio do navio: Essa equipe já havia providenciado, previamente à nossa chegada, mesinhas, cadeiras e guarda-sóis para atender aos passageiros. Depois veio o lanche que pudemos desfrutar na beira mar, vendo o navio ao largo e o movimento das lanchas. Ficamos um bom pedaço conversando embaixo do guarda-sol. Depois, Clarinha e eu, fomos tomar banho de mar. A água estava muito fria. Diferente da temperatura cálida da água de Camboinha, a nossa praia de veraneio, situada em Cabedelo- Pb, próximo a João Pessoa, onde tinha a ilha temporária de Areia Vermelha.
Depois decidimos dar uma caminhada até o outro lado do morro e rever a cidade de Arraial do Cabo que já conhecíamos por ocasião de uma outra viagem. Marcondes e Terezinha não foram e ficaram conversando com Roberto e Bernardete. Lá, em Arraial do Cabo, nos encontramos com Salvador que, descalço, caminhava com dificuldade, entre as pedras do calçamento irregular da cidade.
Por volta das14:30 horas pegamos a lancha para o navio com o objetivo de almoçar, embora tivéssemos comido bastante do lanche que fora servido na praia.
Não pude deixar de comparar o balanço intenso da lancha que nos conduzia com a estabilidade do navio. Por falar nisso, uma das minhas preocupações, ainda quando estava em João Pessoa, antes de embarcar, era quanto ao balanço do navio que poderia provocar enjôo. Antes de iniciar a viagem providenciei a nossa caixa de remédios, onde não faltou o anti-emético., o famoso Dramin. Graças ao conforto do navio não foi necessário apelar para o remédio. . Ainda, a propósito do tema, lembro que no canal 2 da TV da cabine, que abordava temas de navegação do navio, um gráfico mostrava o tamanho das ondas e a sua classificação. Durante todo o nosso cruzeiro a altura das ondas se situou nos níveis mais baixos da escala. Acredito que isso é que contribuiu, em muito, para tornar o passeio tão agradável.
Na tarde desse dia fomos para a piscina onde tive uma outra curiosidade saciada. É que já havia procurado saber se a água da piscina era salgada ou doce e não tinha ainda obtido resposta. Tinha perguntado a Quitéria, minha cunhada que havia feito um passeio no mês anterior em um navio da mesma companhia do nosso, o Melody, e ela não soubera responder, pois não tomara banho na piscina. Pois bem, foi eu entrar na piscina e provar a água salgada do mar. Naquela noite pude também verificar que as piscinas tinham sido esvaziadas e que todas as noites isso ocorria para, no dia seguinte, serem cheias novamente com água do mar.Tinha lógica: o navio se livrava de um peso desnecessário à noite e economizava combustível..É bom lembrar que os chuveiros de apoio eram com água doce e quente. Assim como também as jacuzzis, com hidromassagem.
Por falar em água doce não sei se a água potável do navio era armazenada em tanques especiais, abastecidos em terra ou se o navio possuía uma estação de dessalinização da água do mar. Lembro que o Cisne Branco, o veleiro-escola da Marinha do Brasil, que tive a oportunidade de visitar uma vez quando atracou no Porto de Cabedelo, possui uma estação de dessalinização. Não sei se o Armonia também possui. Fiquei com essa dúvida. O fato é que a água do banho no chuveiro das cabines eradoce,farta e quente.
Depois do jantar fomos ao Teatro assistir o espetáculo denominado “ Fantasia Flamenca” .Fomos dormir bem tarde, pois planejamos dormir até mais tarde no dia seguinte que não teria atracação.Era dia de navegação até Ilhéus.
Sexto dia – Conseguimos vagas nas cadeiras da piscina e ficamos, todo o grupo, descansando e tomando banho. Pedimos cerveja e a jovem garçonete, que não falava português. Natural da Ucrânia, conforme descobrimos depois de juntar todos os esforços da equipe e tentar decifrar o que ela falou em inglês. Chamava-se Irina, segundo revelou o crachá que portava, e nos trouxe cerveja Brahma, nacional. Por cada latinha pagamos a importância astronômica de US$ 3,60, o que significava que cada latinha tinha o preço de quase R$ 10,00. Em contrapartida, é verdade, que o tira-gosto era farto e variado. Era só pegar, no bar Il Girasole. Ficamos ali nas piscinas nos espreguiçando até aproximadamente ás 15:00 horas, quando fomos nos trocar para almoçar no Brasserie. Depois do almoço voltei à livraria para dar continuidade ao livro que estava lendo enquanto Clarinha foi passear com Terezinha. Marcondes foi ao cassino.
Naquela noite pusemos, novamente, o terno para o jantar. Nesta noite aconteceu o coquetel de boas vindas para os passageiros embarcados no Rio de Janeiro e em Santos. Foi bem mais elaborado e mais festivo do que o nosso, dos passageiros que embarcaram em Salvador. Em função dessa festa que, diferentemente da nossa aconteceu no Teatro La Fenice ( o nosso foi no Armonia Lounge,) o horário do show noturno foi modificado para as 23: 45 horas, para os hóspedes do 1º turno do jantar, que era o nosso caso. (lembro que o horário normal era 22:15 horas).
Nós não fomos a esta festa. Decidimos passear no bar Del Duomo. Conversando com Roberto, Salvador e Marcondes, comentei que estava estarrecido, pois no navio, que possuía tantos ambientes, diversificados, não havia nenhum ambiente para o recolhimento espiritual dos passageiros, algo como uma capela ecumênica. Depois do jantar fomos dar uma volta no cassino., para esperar que desse a hora do Teatro que naquela noite apresentou o show “ Extravagância” – Uma menina sonhadora viajando em um mundo de fantasia...





Sétimo dia- Chegamos em Ilhéus como estava previsto, às 08:00 horas. Acordei logo cedo. Por volta de 06:30 horas avistei a cidade. Fui para a popa olhar a aproximação da terra, e a atracação.
- Clarinha- eu disse- é sempre bom rever Ilhéus e lembrar que foi palco de várias histórias contadas por Jorge Amado. O bar Vesúvio, de seu Nacib, do romance “ Gabriela, Cravo e Canela” , ainda existe. O museu de Jorge Amado, o Bataclan, etc.
O nosso grupo contratou uma van e fomos passear pelas praias de Ilhéus. Praia Jacarezinho, Praia de Itacaré e Praia da Concha, foram algumas das quais me lembro.
Voltamos a tempo para fazer o almoço à bordo do Armonia. Em seguida ficamos esperando ansiosos a saída do navio prevista para as 18:00 horas.
Naquela tarde houve uma reunião no Teatro La Fenice para quem desembarcaria- como nós - em Salvador, para informações importantes sobre bagagens, pagamentos, questionário, etc .
Á noite, após o jantar, quando, na oportunidade, Clarinha e eu entregamos a Michelle o envelope com a sua gorjeta, fomos ao teatro. O show foi inesquecível e teve a denominação de “ Magic Night com Cripton”.
Naquela noite Marcondes e Roberto compraram uísque “ Johnny Walker” em uma das lojas do centro comercial do navio. O preço estava bastante convidativo. Porém, eu decidi não adquirir o produto, por contenção de despesas.
Fomos juntos às compras com Marcondes e Terezinha e, Clarinha e eu aproveitamos para dar uma olhada no comércio de bordo. Achei tudo muito caro, à exceção do uísque.. Alguns produtos estavam marcados em euros, outros em dólares. Os preços não estavam convidativos. Não compensava comprar.
Passamos no Armonia Lounge. Fomos depois para a discoteca. Esperamos a hora do lanche das 00:30 horas que foi servido no Il Girasole Buffet Tropical.
Clarinha, muito organizada, já tinha preparado a mala, durante a tarde daquele dia. Quando chegamos à cabine, antes de dormir, fizemos uma última arrumação e pusemos a mala no corredor, como fomos orientados a fazer. Ficamos apenas com a valise de mão com os apetrechos de uso pessoal.
Oitavo dia – Chegamos de volta a Salvador e ao fim do cruzeiro. Apesar de ter dormido muito tarde acordamos cedo para vê a atracação que aconteceu no horário previsto. Quando voltamos à cabine constatamos que o nosso cartão de entrada na cabine já estava bloqueado. Lembramos que no dia anterior nos informaram que a partir de 8:00 horas as cabines precisavam ser desocupadas. Falamos com Putu, a nossa camareira, que, gentilmente, abriu a porta para nós para que pudéssemos fazer uma última inspeção na cabine que ocupamos.
Em seguida fomos esperar na Recepção a liberação dos passageiros que desembarcariam naquele porto..
- Clarinha- falei- Mesmo passando oito dias dentro deste navio não tivemos oportunidade de usufruir de todos os seus atrativos. Estou vendo- disse folheando um material impresso sobre o navio- que não conhecemos o Escritório de Excursões, o Armonia@café o Spa Health Centre, a Sauna e a Academia de Ginástica. Também não deu tempo de fazer as caminhadas pelo deck da piscina, conforme tínhamos pensado..
O vôo que nos levou a Recife estava marcado para às 20:30 horas.Tivemos o dia inteiro em Salvador. Fomos, Marcondes, Terezinha, eu e Clarinha, fazer um passeio pela cidade através de uma empresa de turismo receptivo, previamente contratada em João Pessoa, antes da nossa viagem.
O “ city-tour” terminou no aeroporto, onde ficamos. Estávamos no restaurante do aeroporto de Salvador quando recebi uma ligação telefônica, no meu celular, originada por Quitéria, de João Pessoa, que me deu uma notícia muito triste. Geraldo, o meu cunhado, irmão dela e de Clarinha, havia falecido, no segundo dia de nossa viagem. Reclamei para Quitéria do silêncio que ela e todos mantiveram sobre este acontecimento que só agora ela me revelava. Ela justificou que houve uma decisão conjunta, tomada pelos nossos familiares de nos poupar da notícia até aquele momento, para não estragar o nosso passeio. Fiquei muito impactado emocionalmente com a informação e preocupado como seria a reação de Clarinha quando soubesse da triste notícia. Geraldo morreu aos cinqüenta e nove anos, subitamente, na cidade de Guarabira, distante cerca de 90 Km de João Pessoa, onde administrava um pequeno sítio.
Clarinha ficou curiosa para saber o que tinha sido revelado por Quitéria ao meu telefone, pois notou a mudança ocorrida em mim após o telefonema. Despistei o quanto pude, para evitar dar a notícia grave.
Falei para ela sobre uma doença que acometera Geraldo, de repente, e que ele estava muito mal, hospitalizado em João Pessoa. Disse adicionalmente a ela que Quitéria estava nos esperando em nosso apartamento para contar os detalhes do acontecido. Clarinha, é claro, ficou bastante ansiosa e também perdeu o apetite. Chamei o garçon e suspendi o pedido do nosso jantar.
Quando chegamos ao aeroporto de Recife, Luiz Fernando e sua esposa Carine, bem como Luiz Rodrigo e Clara Giovana nos aguardavam.
Clarinha falou para eles que estava desconfiada da morte de Geraldo. Foi quando eu disse para ela que isso realmente tinha acontecido. Foi um momento de grande tristeza, sobretudo, para ela que estava tomando conhecimento do ocorrido naquele momento. Todos nós também estávamos tristes, o que contrastou com a alegria do nosso reencontro, após o retorno da viagem.
BOAS RECORDAÇÕES- Este cruzeiro que fiz, juntamente com Clarinha, na companhia agradável e amiga de Marcondes e Terezinha, foi maravilhoso. Esse passeio, que vai ficar para sempre em minha memória, foi também muito divertido. Desse cruzeiro restaram boas recordações. As boas recordações ajudam a enfrentar o quotidiano que, muitas vezes, não se revela agradável e às vezes, apresenta problemas que consomem nossas energias.. As boas recordações são como que reservas mentais de força emocional positiva, Isso é muito importante para ajudar nos momentos difícies.
Desse cruzeiro restaram também as boas amizades que fizemos com as pessoas com as quais tivemos oportunidade de conviver naqueles dias tão felizes- a turma do jantar.
Por ocasião do retorno dessa experiência tão boa, que para mim se constituiu na realização de um sonho antigo, prometi aos meus amigos e familiares, escrever relato que pudesse transmitir a sensação que senti ao fazer este cruzeiro no Armonia. Desejo compartilhar com todos eles, esses momentos tão agradáveis que vivi, juntamente com Clarinha. Foi com este objetivo principal que o escrevi.. De forma extremamente simples e despretensiosa, pretende, entretanto, repassar para todos os que lerem, o que efetivamente se passou naqueles dias.
Marcondes, Terezinha, eu e Clarinha, estamos pensando em fazer outro cruzeiro. O destino pode ser a Europa e o navio, o mesmo: Armonia. O Armonia quando volta para a Itália atraca no porto de Genova. É um bom destino.


Camboinha( PB ) , fevereiro/março de 2006